Ontem eu voltei à época em que
lençóis eram minhas paredes, e cortinas. Mesmo assumindo o “imprevisto”, tido
pela desatenção da pessoa responsável de abrir o espaço, causando atraso no
início da oficina, Charlon consegue me mostrar um caminho para apontá-lo uma
nova proposta de abertura da oficina, aliás, a análise e preparação fazem parte
do processo de estudo e execução. Para mim, não foi nada incômodo esperar e ver
a preparação do espaço, pelo contrário, ver a Câmara de vereadores de Vertente
do Lério se transformando no nosso quintal de trabalho foi uma das coisas mais
bonitas de ser vista em toda oficina, além da dinamicidade e bom humor que o
facilitador a conduz, é claro.
É visível o amor e a responsabilidade
com que Charlon conduz a oficina e ergue a bandeira da arte-educação. Tudo
posto em debate é sempre extremamente válido e exaustivamente testado e
discutido por quem está dentro do contexto. As lembranças fluem naturalmente, e
as sensações de estarmos do lado de quem aprende nos faz perceber como as
coisas devem ser conduzidas, exatamente assim, cuidadosamente, com uma cautela
de quem recebe para poder disseminar. As dinâmicas, e os momentos de distração
logo terminam em exercício reflexível, e parar para pensar que a distração está
intimamente ligada a produtividade faz parte desta reflexão.
A função me dada nesta etapa do
projeto, começa a se tornar uma difícil tarefa. Os trechos ““tu vens chegando pra brincar no meu quintal” e “o sol quarando nossas
roupas no varal”, na música executada pelo João (a propósito, muito bom
músico que deve seguir carreira teatral), me arrepiam e consegue me tocar e
sensibilizar, fazendo compreender a função e ideia de proposta da música ao
vivo na oficina. Sutilmente útil e funcional, a música, neste exato momento. O
problema é que depois isto não se repete, e a impressão de ter uma música
específica para cada momento se vai (conste, esta visão é apenas para os
momentos de música, os efeitos sonoros funcionam como elemento provocativo, não
como ilustração).
O quintal se forma, consegue
envolver-nos. Para mim fica muito claro a função da atividade de formação de
multiplicadores da ideia. Concentração, memória (conhecimento prévio),
dinamismo, sensibilização, relativização, e vários outros elementos e ideias
ficam presos ao subconsciente da nossa atenção, para que isso seja atentado na
percepção da troca de informação dentro da minha sala de aula.Resta a
aplicação, que agora, é de fácil execução.
A utilização da arte como meio de
entrar em contato com a verdade, é sem dúvidas a melhor forma de se chegar lá,
a falta de pretensão da arte nos possibilita isso. Eu tenho agora a impressão,
que temos que procurar meios que façam com que isto funcione na prática, assim
um dia quem sabe, as escolas brasileiras (lê-se sistema de ensino e ações
pedagógicas) deixarão de treinar alunos e passarão a ensiná-los, formá-los
mesmo, como sempre deveria ser, e ações com abertura para a discussão desta
mudança como “O Quintal” (mesmo que de forma intrínseca e sutil) tenham mais
espaço e construa uma forma de pensar arte sociopoliticamente, de verdade.
André Chaves
Ator e diretor.